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quarta-feira, 6 de junho de 2018

Transvaloração dos valores: o além do homem

Ao encerrar nosso processo de análise das origens da moral estudando Nietzsche, vamos ver que o filósofo propõe a transvaloração dos valores, quer dizer, uma reinvenção do significado daquilo que até hoje foi a oposição entre “bem” e “mal”, uma vez que eles não são absolutos e sim relativos, podendo ser recriados pela humanidade. Essa transvaloração pretende restabelecer o equilíbrio de princípios constitutivos da realidade e do homem.

Dois princípios : Um deles representa a ordem, o saber, o intelecto, a razão e está ligado ao deus grego Apolo, por isso se chama “apolíneo”; o outro representa a desordem, a emotividade, a sensualidade, o corpo, irracionalidade e é expressado pelo deus grego Dionísio, sendo o poder “dionisíaco”. O equilíbrio está no balanço entre mente e corpo, os dois são o próprio homem, ser desse mundo físico regido pela dialética ordem-desordem.

A filosofia de Sócrates e Platão (séc. V a.c.), no entendimento de Nietzsche, rompeu o equilíbrio dessas forças afirmando que o homem deve privilegiar a razão (apolíneo), pois ela é sua própria alma, imortal e de outro mundo, o mundo intelectual. Isso tornou o ser humano mais “espiritual” do que ele realmente é, negando a vida material e natural (dionisíaco) em detrimento do intelecto como essência ou alma humana. O “bem” virou produto do raciocínio, atividade própria do intelecto/alma e depois o cristianismo reafirmou sua origem em Deus, “razão” transcendente criadora e absoluta. Assim, o “bem” e outros valores se tornaram absolutos por causa de sua fonte.  

Criaram-se duas morais: a moral dos fracos ou escravos, que afirma que o “bem” está na humildade, na piedade, na obediência, ela é absoluta e provém de Deus; a moral dos fortes ou senhores, histórica e humana, que diz que o “bem” está em viver os prazeres, o poder, a alegria, a criatividade, a vontade.

A moral dos fracos venceu essa disputa histórica, invertendo os valores. O “bom” é aquele que obedece e aquele que manda agora é o “mau”, e o desfrute do “bem” está depois deste mundo. Nietzsche denuncia essa inversão como uma farsa, como niilismo - o idealismo-espiritualismo é o nada, é ausência do ser - uma vingança dos ressentidos desse mundo, incapazes de mudar a realidade e que apelam a Deus, força dominadora em outro mundo transcendente, espiritual e improvável, como o senhor que recompensa o “bom”, o fraco e humilde e pune do “mau”, o forte, o orgulhoso, o poderoso, que só pode ser assim por não depender de ninguém a não ser de si mesmo e, por isso, é livre.  

Nietzsche propõe a restituição do equilíbrio dos valores por meio da transvaloração.
Seria criar uma nova moral fundada no sentido da moral do senhor, mas para todas as pessoas que a quisessem assumir. Ela seria o início da renovação do ser humano e a consolidação da sua autonomia por meio da libertação do jogo de oposição entre “bem” e “mal” como são conhecidos hoje, resultado da luta histórica entre fortes e fracos. Essa moral viria com algumas atitudes:

- um sim à vida: poder de afirmação corajosa da vida com alegria, com amor, existir realizando todas as potencialidades pessoais agora, sem esperar a felicidade em outro mundo ou outra vida além deste;

- criatividade: poder de criar valor onde ele não há, beleza onde ela não existe, inovar os costumes sempre para melhorar a vida e aumentar a liberdade, criar novos significados para tudo;

- liberdade: poder realizar-se sem a necessidade da permissão social ou de qualquer autoridade, ser livre para viver a própria vida, sua racionalidade e emotividade como se quer sem se submeter aos condicionamentos da cultura ou moralismos, questionar tudo e buscar sempre a sua própria verdade.


Deste processo surgiria um novo tipo humano, mais livre, mais altivo, com mais autoestima: Nietzsche o chamou de “além do homem” ou o “super-homem”, que vive o poder de sua vontade ou sua vontade de poder.

1 - Do que você se libertaria para se tornar mais “senhor” de sua própria vida?

2 - Isso daria mais alegria a você agora, nessa vida? Por quê?

3 – Que relação há entre o conceito de autonomia, já estudado, e a filosofia de Nietzsche? 

4 - Na primeira imagem de Nietzsche há uma citação do livro Aurora. Como você interpreta o texto que está no foto? 

imagens: Quora, internet