Sua revista escolar de filosofia.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

"Os que estão contra mim"

Filosofia só é possível filosofando.

“[...] de mim não aprendereis filosofia, mas antes como filosofar, não aprendereis pensamentos para repetir, mas antes como pensar”. KANT, Crítica da Razão Pura. 

Ousar saber é maturidade intelectual de cada indivíduo que, somados, fazem a cultura iluminada de um povo. 

Quem sabe, um dia, cultura de toda a humanidade, inclinada por natureza ao saber, como diz Aristóteles

Para chegar lá, é preciso esforço intelectual.
Aquele que conquista a autonomia

Que faz do filosofar, atividade crítica, sistemática e reflexiva insistente, metódica, mas criativa. 

Esta é a ideia central do texto de Agostinho da Silva, filósofo português. 

Dele, deixamos um texto que é um clamor ao saber

Meu caro Amigo: do que você precisa, acima de tudo, é de se não lembrar do que eu lhe disse; nunca pense por mim, pense sempre por você; fique certo de que mais valem todos os erros, se forem cometidos segundo o que pensou e decidiu, do que todos os acertos, se eles forem meus, não seus. Se o criador o tivesse querido juntar muito a mim não teríamos talvez dois corpos distintos ou duas cabeças distintas. Os meus conselhos devem servir para que você se lhes oponha. É possível que depois da oposição venha a pensar o mesmo que eu; mas nessa altura já o pensamento lhe pertence. 

São meus discípulos, se alguns tenho, os que estão contra mim; porque esses guardaram no fundo da alma a força que verdadeiramente me anima e que mais desejaria transmitir-lhes: a de se não conformarem. […] Você tem a liberdade para decidir: pode ser literato, ou retórico, ou simples homem vibrando, ou filósofo […]. Mas seja filósofo a sério. Procure compreender os sistemas dos outros antes de criar um seu: se acha errado um grande filósofo, pense sempre que o erro é seu: é fora de dúvida que se não pôs e não venceu a fácil objecção que você lhe levanta (e talvez você até ao fim da vida só possa levantar fáceis objecções), é porque ela não tem razão de ser e vem dum engano seu. 

Estude ferozmente, com os dentes cerrados, empregue toda a sua força, estoire os músculos: ou você domina a filosofia ou a filosofia o domina a você: só quem é forte se apaixona; mas se você for ovelha ante os filósofos, só lhe resta um destino: o de balir. É preciso que haja no seu combate e logo nas horas de princípio um tal ímpeto de ataque, uma tal segurança de passo, que nenhuma fortaleza lhe possa resistir; empregue-se todo na sua faina, vá pelo simples à variedade, pelo especialismo ao total; ganhe primeiro uma disciplina, só depois se poderá lançar em aventuras. 

Sete cartas a um jovem filósofo.

imagem: rtp.pt

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Viver ou morrer?

Se você fosse um doente terminal, preferiria morrer? 

Escolheria a morte voluntária assistida, a eutanásia, como é permitido em alguns estados como Oregon, Montana nos Estados Unidos ou em países como a Bélgica? 
Mesmo quando há uma procuração ou autorização, ela é legitimada pelo indivíduo, que a expressou enquanto cognitiva e emocionalmente capaz. 

O assunto é sério, implica uma profunda reflexão e remete a liberdade do arbítrio de cada sujeito e o que ele faz em relação à própria vida. 

Peter Singer, utilitarista australiano que milita em causas relacionadas à ética, sendo um dos mais influentes filósofos contemporâneos, defende a livre decisão privada nestes casos. Nem a lei, nem a moral possuem legitimidade ao arbitrar sobre a ação individual naquilo que o indivíduo faz com sua própria vida, pois entende-se que o sujeito é soberano e independente para deliberar e agir em relação a si. 

Vejamos um pouco do ponto de vista utilitarista.

O cálculo utilitarista prevê que a autonomia do indivíduo seja exercida a partir do critério elementar do prazer e da dor.

Pode ser?

Vejamos o correspondente epicurista: prazer e dor são sensações do corpo e o homem é essencialmente estético, material, biológico. A natureza o dotou, como a outros seres sensíveis, deste critério anterior à racionalidade para ele conduzir sua ética. Por isto o hedonismo tem o prazer como móvel da ação

Uma vida feliz é uma vida de prazeres

A prudência entra como segundo critério que permite julgar com maior propriedade se certos prazeres são necessários à vida feliz ou não. E como o sujeito tem na base da experiência as sensações, temer a morte ou o julgamento moral dos deuses é ingenuidade. A morte é o fim das sensações, os deuses são indiferentes, a realidade físcia é regulada pela mecânica dos átomos.

Para o utilitarista, a boa ação é aquela que aumenta o prazer da maioria e reduz a dor. Em casos clínicos irreversíveis, o sofrimento que causa no doente e no círculo próximo a ele, poderia ser diminuído com a morte voluntária. Ela cessa a dor do doente e restabelece assim as condições para construir novo bem-estar nos que ficam.

Parece justo se o sofrimento for visto como desprovido de qualquer utilidade.

Parece lícito se depois da morte houver o nada.

Parece ético se cria um parâmetro pelo qual a comunidade possa balizar a decisão privada nestes casos.

Mas, e as outras éticas que afirmam um fim para a vida humana em qualquer condição e vetam ao homem dispor da própria vida sendo ela um bem maior em si?


Valores éticos, como diz Wittgenstein, são transcendentais.

A ética não faz parte do mundo.

Não se exprime por proposições. 

Não é a descrição de um estado de coisas objetivo. 


Como é que fica? 

link: youtube
imagens: bioedge, valorizeaebd, numerocin