Sua revista escolar de filosofia.

domingo, 19 de outubro de 2014

É feliz e pronto

Diante das incertezas da vida, precisamos de estímulos positivos algumas vezes.

Ter um pensamento otimista que nos faça avançar sobre barreiras e sermos pessoas realizadas.
Um mercado gigantesco de literatura voltada a oferecer fórmulas de sucesso prontas movimenta a venda de livros, por exemplo. Segundo uma projeção no início deste ano da Câmara Brasileira do Livro, o segmento da autoajuda tem sido uma das apostas editoriais para 2014.

Contudo, que tipo de sabedoria há na autoajuda?
É discutível, pra lá de discutível.

Vamos ver uma típica frase que serve de motor emocional e avaliar o que ela contém.

Diz o cartaz eletrônico que "a esperança é a única coisa mais forte que o medo".

É positiva, propõe uma reflexão sobre a necessidade de se ter esperança para ir adiante.

Porém, será que a sentença é uma verdade válida?

Spinoza, na terceira parte da Ética, capítulo chamado A origem e a natureza dos afetos, analisa a relação entre esperança e medo e chega a uma conclusão diferente do poeta que elaborou a arte aí acima.

Para o filósofo, esperança e medo são inseparáveis.

Se unem pela dúvida. A alegria esperada ou o sofrimento temido são possibilidades abertas nestas duas emoções instáveis. A esperança traz consigo o medo do fracasso. Com ele em baixa, ela se torna confiança e alegria. O medo vem acompanhado da esperança do sucesso. Se ela declina, ele se transforma em desespero.



A esperança quer derrotar o medo. O medo quer vencer a esperança. Mas, não podem, já que um contém o outro. A oscilação ente ambos é inversamente proporcional. A esperança elevada reduz o medo e vice-versa.

O que pode superá-los é a certeza.

Se você tem a certeza da tristeza e nada mais pode fazer, conforma-se. É infeliz sem contorno da situação. Contudo, ao estar conformado, deixa também de temer, pois o pior já está consumado. Nesse estado pode-se encontrar estabilidade.

Se você está certo da alegria e que nada pode tirá-la de você, então, é feliz e pronto.
Não precisa temer que este afeto tenha fim, pois pode garanti-lo a si próprio sua continuidade, o que também é estável.

A certeza elimina as oscilações entre esperança e medo e produz segurança.

De acordo?
Quais são as suas certezas?

imagens: novotempo, keepcalm.uk, kdfrases
link: dci

sábado, 18 de outubro de 2014

A mulher do outro

Em alguns lugares do planeta, neste momento, algo trágico acontece.

Ou é realizado.

Aquilo que acontece, é fatalidade, não é previsível ou controlável. Na Itália, o excesso de chuva dos últimos dias já matou algumas pessoas. Este é um exemplo.

Como o ebola, que avança no continente africano, na Europa e nos Estados Unidos.

Aquilo que é realizado é voluntário.

A sangrenta batalha em Kobani, na Síria, entre forças curdas, com apoio turco, sírio e norte-americano contra terroristas do Estado Islâmico segue fazendo vítimas. Outros conflitos na região também matam.

Isto preocupa você?

Comove?

Provalmente, por estar longe do Brasil, os problemas nacionais sejam mais impactantes.
Ainda mais, as questões próximas ao círculo de convívio de cada um. Isto é natural.

Mas, por quê?

Bom, a psicologia, pode dar uma resposta às reações humanas a estes estímulos. Outras ciências também podem.

Contudo, a intenção aqui é trazer a reflexão de Epiteto, filósofo estoico, para uma forma comum de reagirmos às fatalidades ou às circunstâncias que, deliberadas ou não, ferem nossos interesses.

Epiteto diz:

"Podemos conhecer a intenção da Natureza por meio das coisas em que não temos interesse algum... Falece a mulher ou o filho de outro? São casos humanos. Morre nosso filho ou nossa mulher? Logo então gememos e exclamamos: ai de mim! Conviria, pois, recordar o que fizemos nos mesmos casos, quando se tratava dos outros." (Manual, 26)

É possível ser racional em questões tão sentimentais?
Pode-se encarar as tragédias pessoais com esta serenidade?
O que diriam se perdas pessoais fossem tratadas com indiferença?
Importa o que diriam?

Para o estoicismo, a ataraxia ou serenidade é uma estado anímico desejável. Revela sabedoria e controle sobre si mesmo, ou seja, autarquia. A dor psicológica é resultante de ignorância. É efeito de não compreender que a realidade é regida por força superior à humana e por esta, incontrolável.

A intenção da Natureza, no dizer de Epiteto, se revela quando não estamos envolvidos na ilusão de posse e controle da realidade e das coisas, como quando criamos laços afetivos e tentamos cristalizar o real, o ser, detendo-o.

A realidade é impermanente.
Esta é a metafisica: tudo está em constante mudança.

E nós, nada podemos contra isto, a não ser aceitar e não se perturbar.

Esta é a paz.

Você concorda com os estoicos?


MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo. São Paulo: Mestre Jou, 1973.
fontes: Euronews, Público
imagens: Reuters, wikipedia