Olá, filósofos!
Na moral, vamos a mais uma questão de Enem?
Essa é uma pergunta que para responder, precisa conhecer um pouco melhor os fundamentos da filosofia do autor.
Uma questão sobre filosofia prática, que é aquela que se dedica às reflexões sobre os costumes, quer dizer, a moral e a ética, portanto, os valores, as escolhas, a conduta.
Vamos a um breve resumo tópico sobre a
moral kantiana. Kant é demais, gente!
Olha o look, so bad...
Vamos lá!
Em primeiro lugar, vamos destacar o que Kant chama de "imperativo categórico". Ele é o que podemos chamar de um "fórmula" para os juízos morais. Então, ele não contém o conteúdo, ele é a forma racional para delimitar o que será moralmente válido. O que o imperativo categórico kantiano enuncia é que ao julgar a ação, o sujeito, o ser humano, racional, consciente, tenha em mente que a sua ação possa se tornar uma lei universal.
Quer dizer o seguinte, se aquela ação que você pretende executar pode ser copiada por todas as pessoas e assim produza entre todos efeitos que não firam a dignidade de ninguém, não tragam prejuízos, não estimulem a trapaça, a mentira, a desonestidade, a discórdia, enfim, não faça de ninguém o meio para obter vantagens pessoais. Por que isso? Porque para Kant, só será moralmente válida a ação que não tenha por objetivo interesses pessoais, mas sim o respeito absoluto ao dever de agir com perfeição buscando o resultado de excelência para todos. Ações que têm aparência de serem morais mas na essência atendem a interesses particulares e não à universalidade do dever são aquelas que Kant classifica como imperativos hipotéticos.
Portanto, se a ação de alguém puder ser copiada por todos e produzir bem-estar para todos, essa ação é a preferida, mesmo que haja sacrifício de quem a toma. A ação moral não é para produzir satisfação pessoal e sim para garantir na prática que o dever foi cumprido. E qual é o dever? Aquilo que a razão mostra como sendo o modo excelente de respeitar o que é ético. O que é ético é o que vale para todos e não apenas para um ou alguns já que a ética é pretensamente universal como conjunto de normas para a boa ação. Uma sociedade kantianamente ética seria aquela em que todos podem confiar em todos porque todos agem com o objetivo de respeitar o dever ético e não para obter satisfação pessoal. Nessa sociedade a paz estaria garantida, o engano não existiria, bem como qualquer vício do caráter produzindo danos.
Entendido isso, vamos à questão.
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(Enem/2017) Uma pessoa vê-se forçada pela necessidade a
pedir dinheiro emprestado. Sabe muito bem que não poderá pagar, mas vê também
que não lhe emprestarão nada se não prometer firmemente pagar em prazo
determinado. Sente a tentação de fazer a promessa; mas tem ainda consciência
bastante para perguntar a si mesma: não é proibido e contrário ao dever
livrar-se de apuros desta maneira? Admitindo que se decida a fazê-lo, a sua
máxima de ação seria: quando julgo estar em apuros de dinheiro, vou pedi-lo emprestado
e prometo pagá-lo, embora saiba que tal nunca sucederá.
KANT, l. Fundamentação da metafísica dos costumes. São
Paulo. Abril Cultural, 1980
De acordo com a moral kantiana, a “falsa promessa de
pagamento” representada no texto
a) Assegura que a ação seja aceita por todos a partir livre
discussão participativa.
b) Garante que os efeitos das ações não destruam a
possibilidade da vida futura na terra.
c) Opõe-se ao princípio de que toda ação do homem possa
valer como norma universal.
d) Materializa-se no entendimento de que os fins da ação
humana podem justificar os meios.
e) Permite que a ação individual produza a mais ampla
felicidade para as pessoas envolvidas.
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Com a clara noção do que Kant exige para que uma ação seja moralmente válida e que seja assim uma regra ética, fica mais fácil acertar a alternativa.
Não pode ser a "a" porque para Kant a validade de uma regra ética não está no consenso e sim no respeito ao dever acima de qualquer discussão ou deliberação comunitária. Se a regra ética deve ser universal, vale em qualquer tempo e espaço, logo, para todos os seres humanos independentemente do meio em que vivem. Isso porque o parâmetro para julgar é a tal fórmula "age de modo que tua ação possa se tornar uma lei universal" e não age conforme a maioria decidir. Essa reflexão é individual e não coletiva apesar de dever ser feita por todos.
Não pode ser a "b" porque para Kant as regras éticas não são determinadas pelas consequências da ação como quem decide agir por causa do efeito produzido. As ações são tomadas a partir da intenção de respeitar o dever ético de agir querendo garantir a universalidade dessa ação e não porque se vai ter o resultado favorável à satisfação pretendida. Uma ação que garanta a vida futura na Terra, para ser moralmente válida, teria que garantir a vida de todos e isso exclui atitudes que sacrificariam uns em benefício de outros, por exemplo. Então, esse efeito proposto para a alternativa não é suficiente para validar a ação nem explicar porque ela seria recomendável à manutenção da vida. Mas, o que invalida a resposta no princípio é considerar a consequência como critério de validação ética, para Kant não é assim.
Não pode ser a "d" porque jamais os resultados são justificativas para os meios de chegar até eles, segundo Kant. Esse pragmatismo ético está mais relacionado à filosofia maquiavélica. Para chegar a um resultado justo nunca se deve usar meios injustos, pois isso compromete a ação naquilo que Kant defende como critério de validação ética. Para Kant a intenção tem que ser justa e os meios precisam ser justos. Assim o resultado será também justo: agir de forma que a ação possa ser uma lei universal. Antes de agir, sempre pensar nessa fórmula para verificar se a intenção é justa, se ao colocá-la em prática ela será justa e produzirá exatamente justiça sempre que alguém fizer o mesmo.
Não pode ser a alternativa "e" porque Kant não foca sua ética na felicidade produzida pela ação. A ação ética é aquela que garante o cumprimento do dever, como já foi dito. Isso, às vezes, exige do autor o sacrifício de seus interesses pelo bem maior que é manter o compromisso ético. A maior quantidade de felicidade produzida aos envolvidos faz referência ao cálculo utilitário ou seja, à ética utilitarista. Kant é deontológico, sua ética é a dos deveres. Logo, ele não se importa com a quantidade de felicidade para o maior grupo possível de pessoas, mas define que será ético o que deve ser feito a qualquer preço, pois a ação ética representa o bem máximo que a inteligência lógica humana pode conceber livremente e adotar livremente como regra de conduta, o que faz da ética legítima algo praticamente santo.
Resta-nos a alternativa "c ", de certa, que afirma o sentido do imperativo categórico, que é agir para criar leis universais de conduta com a própria reflexão. No criticismo kantiano, a razão humana produz suas próprias leis e cada ser racional tem em si a condição de chegar por si mesmo às respostas do que é ético ou não. Mentir para ter vantagem, se for uma ação copiada por todos, tem como consequência uma sociedade onde ninguém mais confia e ninguém, pois a desonestidade se universaliza. Desse modo, a própria regra se autoanula uma vez que ninguém a poderá colocar em prática já que todos saberão com antecedência que quando alguém estiver pedindo dinheiro emprestado e prometendo devolver, não vai ser cumprido, então ninguém vai emprestar a ninguém. Mentir por interesse fere também o princípio kantiano de nunca usar outros seres humanos como meio para obter resultados, mas sempre com fins em si mesmos, quer dizer, todas as pessoas possuem importância máxima porque elas são humanas, são livres para pensar e agir e devem ser tratadas com a máxima dignidade por isso e não serem enganadas de nenhum modo ou sofrerem para que alguém ou um grupo tenha êxitos.
Firmeza?!
Essa foi mais longa, mas bem legal!
Claro que acompanhando desde o início a explicação, como disse, ficaria mais evidente a resposta. Mas, já aproveitamos para expor alguns pontos sobre a ética kantiana que podem ser úteis a todos.
Certo que com toda essa explicação você não errou, Enem, Eu!!
Imagem: prosadas09