Como romper com um certo modo coletivo de pensar, se este modo se percebe, está inadequado, e substituí-lo por outro, que pareça melhor?
Filosofar é também perguntar!
Esta questão foi levantada na última aula pelo colega André Luis Teixeira de Mello. No encontro estava sendo estuda a Educação Inclusiva, que tem por proposta incluir pessoas com deficiência na educação regular e formá-las cidadãs tanto quanto possível. Isto significa torná-las independentes, capazes de cuidarem de si e de seus direitos.
O ponto não é debater a inclusão pela educação.
Vamos já partir do patamar de que a inclusão é correta.
Na prática, portanto, a dificuldade é fazer a teoria funcionar, superar preconceitos e outras barreiras significativas e com isso horizontalizar as relações entre o maior grupo de pessoas possível, reconhecendo diferenças, porém respeitando a singularidade, descobrindo e estimulando talentos que permitam que deficientes participem mais ativamente da sociedade.
Contudo, isto não quer dizer que os deficientes devam ser moldados ao padrão cultural, político e econômico vigente, apenas. O esforço deve ser em duas mãos que se encontram. A sociedade também precisa enxergar estas pessoas com olhos acolhedores e transforma-se para estabelecer um convívio equilibrado.
Tudo o que já foi conquistado em termos de acessibilidade demonstra que estamos no caminho.
Mas o que a pergunta do André tem a ver com este processo?
Estudante de Sociologia, o André gostaria de ter uma resposta com fundamentação filosófica.
Vamos buscar a ajuda de um superman ou melhor, de um übermench da filosofia alemã.
Não, não é Nietzsche.
É Kant!
Ele elaborou um dos grandes sistemas filosóficos do idealismo racionalista. É fácil gostar de Kant e irresistível sua argumentação, que é também densa.
Vamos procurar um modo claro e simples de explicar.
Para o filósofo, a realidade é regida pelo princípio de causa e consequência, como um grande mecanismo lógico. A causa eficiente e primeira é não causada por nenhuma outra. É o Ser Sublime e Transcendental, ou seja, não faz parte do mundo natural. Este Sublime, que pode ser chamado Deus, é alcançado pelo senso estético e moral do homem.
"O argumento do desígnio não é um prova teórica, mas uma sugestão moral, que se faz vívida em nossos sentimentos em relação à natureza, e se realiza em nossos atos racionais. Realiza-se no sentido de que o verdadeiro fim da criação é sugerido de nossas ações morais: mas é a sugestão de um mundo ideal, não de um mundo existente. Assim provamos a teleologia divina em todas as nossas ações morais sem podermos mostrar que essa teleologia é verdadeira em relação ao mundo em que agimos." ( SCRUTON, p. 133)
Para Kant, a razão é o meio, mas ela não é capaz de alcançar o Transcendental. Temos sua ideia, idealizamos a finalidade dos fatos chegando à compreensão das forças mais radicais a comandar a realidade, mas não temos como demostrá-las plenamente na instância concreta como objeto do conhecimento.
"O que há a se reverenciar no ser racional é tão somente isto: ele sente e age como membro de uma esfera transcendental, ao mesmo tempo em que reconhece que pode conhecer apenas o mundo da natureza." (SCRUTON, p. 134)
Este princípio age na História conduzindo a Humanidade para estágios superiores de conhecimento, de costumes. Cabe ao Homem entregar-se à atividade de sua razão para chegar ao entendimento do seu dever perante si e o outro e assim contribuir para que esta marcha se dê em boas condições, porque ela ocorrerá.
Aqui está um ponto essencial: são nossas próprias ações que aceleram ou retardam o bem-estar. É necessário ser educado, educar. Escolher melhorar o mundo. Porque, segundo Kant, a progressão é positiva e virá assim mesmo.
"Pode-se considerar a história da espécie humana, em seu conjunto, como a realização de um plano oculto da natureza para estabelecer uma constituição política perfeita interiormente e, quanto a este fim, também exteriormente perfeita, como o único estado no qual a natureza pode desenvolver plenamente, na humanidade, todas as suas disposições." (KANT, p. 20)
Evoluímos!
Então, olhando para a História, observamos as comoções e os avanços, nem sempre percebidos no momento, mas saudados depois.
A educação inclusiva, amparada em direitos humanos universais, se impõe justamente por este fundamento como avanço nas relações entre pessoas com fins na dignidade e na liberdade.
É evolução, Super Kant!
Já diria Gelson Weschenfelder.
fontes: SCRUTON, Roger. Kant. Porto Alegre: LP&M, 2011.
KANT, Immanuel. Ideia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita. São Paulo: Brasiliense, 1986.
imagens: comicvine, fredericdupin, abril
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