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domingo, 19 de julho de 2020

Tipo assim, platônico

O que você sentiria se alguém que você ama muito dissesse assim:

- Olha, tipo... eu também te amo, mas é um amor... tipo assim, platônico.

É, o amor é um caso brabo... 

Ou a gente compreende como ele aparece ou acaba se confundindo! 

Sim, porque o amor nunca é de um só tipo, apesar de ser um mesmo amor. 

Vamos, lá, vamos tentar entender o tal de amor platônico para não se desesperar ou então... se achar o máximo. 

Platão aponta para o mundo da ideais - Escola de Atenas
Platão (428 a.c. - 347 a.c.) é um filósofo importantíssimo para a história da filosofia. Ele desenvolveu o conceito de "ideia" para explicar a origem do Ser. Quer dizer mais o menos que as coisas que existem no mundo físico são cópias de matrizes ideais e eternas, portanto, imateriais. 

Não entendeu, né? 

Pense assim: 

Você olha pela janela e vê árvores. 
Imagina aí.

Cada árvore que você vê é uma unidade singular, uma árvore particular, uma parte do conjunto de todas as árvores que existem. 

Como você sabe que e uma árvore?

Porque você tem uma ideia ou uma representação da árvore dentro da cabeça que faz com que você reconheça cada árvore que vê. Esse ideia é universal, vale para todas as árvores que existem. Se você tiver que desenhar ou explicar o que é uma árvore, você recorre a ideia de árvore ou ao conceito, mesmo que não haja uma árvore na sua frente naquele momento. 

As árvores que estão no mundo físico só estão lá porque é como se elas tivessem sido "desenhadas", fabricadas a partir de uma forma universal, um modelo que existe naquilo que Platão chama de mundo da ideias

Então, há dois mundos: o mundo sensível (físico) e o mundo inteligível (das ideias). 

O mundo físico só existe porque há o mundo inteligível que serve de matriz para tudo ser criado. 

E quem cria o mundo? 

Sem entrarmos muito nesse caminho agora, vamos dizer que Platão entende que é um Ser Perfeito que pensa as ideias (formas) perfeitas a partir das quais o universo material é feito. Tipo um deus, uma inteligência absoluta, o Logos

Bom, vamos então saber o que isso tem a ver com o amor platônico. 

Estamos estudando as características de Eros, certo? 

Para entender o amor platônico, temos que ter em mente essa noção da ideia perfeita

Isso porque Platão vai apresentar Eros, o amor, em dois níveis: um vulgar e um sofisticado
Lindinho, né?!
O Eros vulgar é aquela carência pelas coisas particulares que nos interessam, como já vimos, e que se torna desejo.


Assim, uma pessoa vê num objeto a razão da sua vida, vê na outra pessoa sua metade da laranja.

Por quê? 

Uma das razões é porque acha bonito.

Vê a beleza da pessoa, de uma roupa, de uma obra de arte. 

Quando o amor é apenas o desejo por uma pessoa ou coisa material, ele é vulgar, é um amor simples. É um amor centrado na aparência.

Agora, é por meio desse amor vulgar e simples que se pode chegar ao amor sofisticado, aquele mais sublime, o amor pela "alma do ser amado". 

Se Platão estiver certo, por meio da procura pela essência das coisas, o ser humano chega no que ela tem de especial, de único, mas que é também universal porque está em todos que a possuem. 

Essa essência é imaterial, ideal, perfeita, imutável, universal e não é percebida com os olhos físicos, mas apenas com a inteligência. 

Os olhos físicos enxergam apenas a aparência. 

Então, se alguém se apaixona pela aparência de alguma coisa, esse é o Eros vulgar. 
Mas, se esse alguém é capaz de perceber aquilo que há de essencial nessa coisa, então ele já está amando aquilo que é universal, sublime, único, perfeito e que permite a essa coisa ser tão amável. 

Exemplo: 

Alguém que se apaixona por uma pessoa bonita só enxerga a beleza da pessoa. 
Alguém que se apaixona pela Beleza em si, vê o belo que está além da aparência. 

A beleza em si é a própria beleza em seu estado ideal, imaterial, eterno. Quer dizer, os olhos enxergam as coisas bonitas, mas o intelecto entende o que é a própria beleza e a "vê" como se a "enxergasse" apesar dela ser um conceito, isto é, ser "visto" apenas pela razão. 
ARANHA e MARTINS. Filosofando, p.84

Você reconhece a beleza porque ela está na sua cabeça como a ideia de beleza, mas a própria Beleza em si não está toda na sua cabeça, ela está no mundo inteligível como uma ideia verdadeira, perfeita e eterna com a qual são feitas todas as coisas belas que existem no mundo físico. 

                              Dá uma lida →

O amor platônico, então, é a capacidade de se encantar pela essência, não pela aparência. É a capacidade de amar o que os olhos não enxergam, mas a inteligência sim. É amar as coisas verdadeiras que só são "vistas" pela inteligência e não pelos sentidos físicos. Essas coisas verdadeiras, inteligíveis e universais são também eternas porque não estão sujeitas à ação do tempo, não se desgastam como a beleza física.  

Assim, uma pessoa de aparência feia, ainda é bela porque é um ser humano e possui a grandeza de ser humana, mesmo que como pessoa ela seja imperfeita. 

Então, você enxergou a essência da pessoa, a sua humanidade e o que há de belo nisso, de belo em ser um ser humano. 

Mas, você não vê a humanidade de ninguém com os olhos físicos e sim com a inteligência, o intelecto, a razão porque humanidade é um conceito, uma ideia sobre o que é o ser humano. 

É por meio do Eros platônico, do amor platônico, que o ser humano não ama apenas os sábios, mas ama a própria sabedoria. E por amar a sabedoria, ele se esforça para estar com ela. 

   Eros
O pobre deseja a fartura.
O feio deseja o belo.
O ignorante deseja o conhecimento.   

Quem é carente do saber deseja a sabedoria.

Esse é o amor intelectual, dos que filosofam, dos que querem a verdade porque ela é essencial e vital. 

Então, se alguém disser que sente amor platônico por você, o que ele quer dizer?

Se está na dúvida, leia de novo! 

Espero que você tenha amado o amor platônico!

charles-ddalberto@educar.rs.gov.br

Atualizado em 14/06/21

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