CONTEÚDO PARA PRIMEIRO ANOS - ENSINO MÉDIO
Vamos ler juntos uma pequena história?
No interior da França, em uma zona rural, pelo começo do século XX, um jovem professor de filosofia visitava o local com um amigo. Durante um percurso, eles encontram um agricultor, amigo do amigo do professor. Eles são apresentados e conversam um pouco.
O agricultor pergunta:
- O que o senhor faz?- Sou professor de filosofia.
- Isso é profissão?
- Por que não? Acha estranho?
- Um pouco!
- Por quê?
- Um filósofo é uma pessoa que não liga para nada... Não sabia que se aprendia isso na escola.*
Você também pode ter pensado em algum momento por que aprender filosofia. Talvez, ainda agora tenha dúvida sobre o que ela realmente é. Pode ser até que acredite que um filósofo é alguém que não liga para nada como se ele estivesse acima das outras pessoas em sua dimensão intelectual, sem ser afetado pelos problemas do dia a dia. Tipo um sábio que tem todas as respostas.
Essa é uma visão distorcida da filosofia, mas se alguém pensa assim, como o agricultor, não está errado. Apenas tem a imagem incompleta e até mesmo fantasiosa de quem reconhece, mas não conhece exatamente a filosofia.
Um filósofo é alguém que procura pela sabedoria.
Se ele procura, é porque não tem.
O que move o filósofo atrás dessa carência senão aquele Eros Platônico que já conhecemos, que é o desejo de encontrar a verdade além das aparências e assim se sentir completo?
O que move o filósofo senão aquela amizade fiel à prática do estudo e da reflexão para andar de mãos dadas com a sabedoria?
Se o filósofo não ligasse para nada, ele nada procuraria.
Porém, é claro que o filósofo já não se inquieta tanto com suas próprias ingenuidades, nem com as futilidades do mundo. Já não se importa tanto com a ignorância e seus prejuízos porque seu esforço em conhecer e saber o tornam mais hábil e compreender a realidade e a vida.
O filósofo tem um objetivo, que é conhecer a verdade.
E quem é o filósofo?
Todas as pessoas podem filosofar.
Eu sou uma pessoa.
Logo, eu posso filosofar.
Essa simples dedução nos lembra Gramsci, que já estudamos, e se justifica porque todos somos inteligentes e isso nos faculta a dedicação à filosofia, não a obrigação. Pois, alguém de repente pode ainda achar que ela não importa e que há coisas mais úteis a serem feitas.
O que essa pessoa não percebe é que esse também é um modo de filosofar.É preciso muita filosofia para afirmar que a filosofia não importa.
O poeta português Fernando Pessoa (1888-1935), em Guardador de Rebanhos, diz que "Há metafísica bastante em não pensar em nada."
Percebem que não dá para fugir da filosofia?
A resposta do agricultor já contém algo da filosofia dos cínicos, que acreditavam que o desapego material e o abandono das pretensões intelectuais conduziria à sabedoria legítima e à felicidade autêntica.
Portanto, o que nós fizemos desde o nosso primeiro encontro foi filosofar para não apenas conhecer o que é a filosofia já feita pelo filósofos antes de nós, mas também filosofamos para fazer dessa prática uma ação pessoal, de cada um de nós.
Como diz o filósofo Kant (1724-1804),
"A filosofia é a doutrina e o exercício da sabedoria e não uma simples ciência... a filosofia é, para o homem, esforço no sentido da sabedoria, que é sempre inacabado."Alguém que não liga para nada, não há de se esforçar.
Então, a filosofia é uma ação poderosa que vem mudando o mundo desde seu início, na região da Jônia, na Grécia antiga, território diferente do que é o país hoje, por volta do século VII a.C., porque é lá que começa essa tradição de questionar a realidade para compreendê-la pelo meio natural da razão e não mais pela autoridade sobrenatural dos deuses como tinha sido anteriormente, pensamento que ainda hoje coexiste entre nós nos diálogos entre religião, filosofia e ciência. Assim como a crença que o útil e bom é ter influência social, força política e basta. Isso tudo é importante, mas, mais importante é saber o que fazer com tudo isso.
O poder material não muda o mundo.
O que muda o mundo são as ideias.
Quando mudamos de ideia, mudamos o mundo.
A filosofia é uma evolução intelectual grega que desde seu começo vem mudando ideias, pensamentos e conceitos ao longo da história.
O filósofo Descartes (1596-1650) já nos alertava que a filosofia é "julgar bem para fazer bem."
Na nossa jornada conceitual em torno do amor, aprendemos a julgar melhor o que ele é como fenômeno e assim conhecê-lo bem, julgando melhor sua manifestação para vivê-lo mais sabiamente do que antes.
Para isso, tivemos que percorrer alguns caminhos:
o senso comum, que era nossa primeira impressão, nossas experiências e conclusões ainda confusas e incompletas;
o mito, que era um tipo remoto de sabedoria simbólica com alguma universalidade sobre o tema;
a religião, que é uma cultura presente e que fundamenta sua atividade também no sentimento de fraternidade;
a arte, que hoje abriga as narrativas mitológicas e expressam a sentimentalidade humana de variadas maneiras;
a ciência, que busca observar a emocionalidade humana e de seus fatos extrair conhecimentos válidos.
Com tudo isso, fizemos filosofia juntos.
Hoje você é herdeiro mais consciente de uma tradição do pensamento e pode levar isso com você a todas as partes, porque a sabedoria está em cada um e é feita com o instrumento que a natureza já dotou cada um, a inteligência.
Escola de Atenas (1511) - Rafael Sanzio. Filósofos gregos da antiguidade. |
ANTES DE NÓS
Somos herança de uma história que começa na Grécia e pode ser dividida em grandes períodos que servem para nos posicionar em relação aos grandes temas e paradigmas culturais de suas épocas.
No link abaixo você encontra a historiografia simplificada da filosofia com seus principais períodos e destaques. Tem algo que já vimos e também novos conhecimentos.
Desejo que você aproveite e conheça mais do caminho que vamos ainda trilhar com mais detalhes conhecendo a filosofia, seus conceitos e expoentes.
Bem-vindo à comunidade filosófica!
___________________________________________
Clique no link para saber mais:
*Extraído de André Comte-Sponville, 2011.
Imagens: internet